Há pedaços de quem sou,
nas leiras abertas pelos sulcos da procura.
Cheguei e logo fiz a pedestre peregrinação pelas minhas recordações açorianas. A velha pensão onde tive a ilusão de um caminho que nunca cheguei a percorrer,
a euforia do porto,
a placidez do mar em volta
e a ilha que conheço,
profunda,
enquanto me foi chegando o micaelense
das conversas desta gente antiga.
E lá vou olhando ao longe
o que então procurei em sonho.
E lá vou sentindo
o vazio de já não poder chegar.
Não dizer nada,
deixar que o tempo sossegue
a inquietude,
que a bruma se desfaça à luz do sol,
que o sonho reverdeça os ramos decepados,
que um tronco em flor nos dê alento.
Pode haver tanta vida à nossa beira,
tantos dias de beleza,
de mãos dadas.
Pode haver um tempo de pureza, um rio de fogo galgando as águas e uma casa de silêncios para ocupar. Pode haver quem somos, pode haver mar, à beira da lava negra e da pedra que esmaga o grão. Mesmo aqui, onde as nuvens, a terra e o mar se confundem, no branco cinzento do mau tempo, entre gaivotas, barcos e telas, neste leve chumbo de fundo azul.